Casas vazias e casas devolutas
Aumentar a oferta de casas para arrendar no país é um dos objetivos inscritos no programa “Mais Habitação” apresentado pelo Governo.
Para isso, o Executivo de António Costa quer impor o arrendamento obrigatório de casas devolutas – na prática, os proprietários destes imóveis podem ter de ser obrigados a arrendar a casa ao Estado, que depois a vai subarrendar a um preço de renda acessível
Arrendamento obrigatório de casas devolutas
No documento “Mais Habitação”, em consulta pública até 10 de março, o Governo diz que “o Estado pode mobilizar património devoluto, por razões de interesse público, através do arrendamento por entidades públicas, com o respetivo pagamento de renda ao senhorio”.
A que casas não se aplica o arrendamento coercivo?
casas de férias;
casas de emigrantes ou de pessoas deslocadas por razoes de saúde e razões profissionais ou formativas;
casas cujos proprietários estão num equipamento social como um lar ou estão a prestar cuidados permanentes como cuidadores informais.
"Dos Vistos Gold aos Paraísos Fiscais" por José Luís Ferreira
O Governo anunciou recentemente o fim dos vistos gold, uma decisão que, antes de mais, peca por tardia. Recorde-se que, em 2021, Os Verdes apresentaram na AR uma iniciativa legislativa exatamente com o propósito de acabar com os vistos gold, mas o PS juntou-se à direita para “chumbar” o Projeto de Lei de Os Verdes e impedir o fim destes vistos.
Na verdade, o mecanismo dos vistos gold veio mostrar ser um falhanço na criação de emprego.
Segundo os dados, no total, desde 2012 até 2021, foram concedidos 9 340 vistos gold, associados a investimentos de 5 611 milhões de euros.
Destes valores, 8 782 vistos e 5 071 milhões estão relacionados com o imobiliário, seguindo-se depois a transferência de capitais, com 541 vistos gold e 5 398 milhões de euros.
Até essa altura, foram atribuídos apenas 17 vistos gold pela criação de dez postos de trabalho, e três pela transferência de 350 mil euros ligados à criação ou reforço de capital de uma empresa, e criação ou manutenção de cinco postos de trabalho, regidtando-se duas categorias que nunca conseguiram atrair um único investidor: a que requeria a aplicação mínima de 250 mil euros na produção artística e a que implicava* o investimento mínimo de 350 mil euros em investigação científica.
Ora, os números agora divulgados pelo SEF deixam claro aquilo que Os Verdes há muito têm vindo a denunciar relativamente à associação deste mecanismo com o branqueamento de capitais.
Segundo esses dados, por exemplo e no que diz respeito aos familiares que se reuniram aos titulares de visto gold, desde 2018 - altura em que a UE deu inico à publicação da lista de países “não cooperantes” no que diz respeito à transparência fiscal - o Governo concedeu autorização de residência a cerca de mil e quinhentos familiares oriundos de países que integravam essas listas da UE, sendo que mais de uma centena de autorizações são relativos a familiares originários de países que constam da “lista vermelha”.
Já há muito, portanto, que se impunha acabar com os vistos gold no país, e não era apenas pelos muitos e graves riscos do ponto de vista dos crimes que esse mecanismo pode potenciar, mas também porque os vistos gold acabam por reduzir os direitos humanos a uma mera mercadoria que se compra e que se vende.
Destaque-se também que a instituição de um regime de autorização de residência assente em atividades de investimento em projetos ecológicos (vistos green), como chegou a ser proposto pelo PAN e aprovado na generalidade, com os votos da direita e do PS, em janeiro de 2019, manteria princípios similares aos vistos gold e seria, desse modo, grave e contrária aos interesses nacionais.
Aliás, essa medida previa alargar o regime dos vistos gold a vistos green e Os Verdes consideram que Portugal deve reforçar o seu papel na captação de investimento ecológico, para a economia circular e descarbonizada, mais amiga do ambiente, mas sem recorrer a estes mecanismos que de verde e sustentável têm muito pouco.
A nosso ver, o branqueamento de capitais, o peculato, a corrupção ou os outros ilícitos fiscais e mesmo criminais que, normalmente, estão associados a este tipo de vistos não são menos graves nem deixam de ser crimes apenas porque o investimento que dá suporte ao visto tem uma cobertura ambiental.
Em qualquer dos casos, independentemente da cor dos vistos, estaremos sempre a falar de crimes, e de crimes que se impõe combater com toda a firmeza e com toda a responsabilidade democrática, não abrindo mais portas que potenciem a sua prática.
Para além disso, o regime de atribuição de vistos gold é uma forma encapotada de criar uma discriminação absolutamente condenável e inadmissível, de estabelecer cidadãos de primeira, os que têm dinheiro, e cidadãos de segunda os que, não tendo dinheiro, ficam sujeitos a um verdadeiro martírio para conseguir a respetiva autorização de residência, o que é uma afronta a um Estado de direito democrático e, sobretudo, um monumental atentado aos direitos humanos.
Por isso, Os Verdes consideram que a eliminação dos vistos gold, apesar de tardia, é ainda assim um passo positivo e necessário, sendo um contributo essencial para pôr fim a um mecanismo que favorece a criminalidade económica, para pôr fim a uma das principais causas da especulação imobiliária e para acabar com um privilégio que favorece apenas alguns.
Vamos esperar que esta decisão consiga trazer coragem ao Governo para se envolver a sério no fim dos paraísos fiscais, uma das formas mais comuns de evasão fiscal, estimando-se que haja uma concentração de 26% da riqueza mundial nos paraísos fiscais, e que já há muito se percebeu para que servem e quem servem.
Servem para fugir ao pagamento de impostos e servem as grandes fortunas.
Para além disso as atividades que engordam os paraísos fiscais estão muitas vezes ligadas a negócios pouco claros, à economia clandestina, à evasão e fraude fiscais, ao crime organizado, à lavagem de dinheiro e, até, a práticas que fragilizam a estabilidade mundial, como o negócio da droga e do armamento.
Também por isso, Os Verdes, consideram inaceitável que continuem a existir zonas absolutamente intocáveis, onde a supervisão financeira não entra, a cooperação judicial fica à porta e os próprios Estados preferem fingir que não estamos perante um problema que urge resolver.
Ora, um Estado não deve pactuar com esta economia de casino, perpetuando um sistema onde a generalidade dos cidadãos vive num verdadeiro inferno fiscal, e outros, uns poucos, vivem em paraísos fiscais, gozando do privilégio de pouco ou nada pagarem em impostos pelos seus avultados rendimentos.
Com este passo que o Governo demorou a dar em matéria de vistos gold, espera-se agora que se envolva ativamente para colocar um fim nos paraísos fiscais.
Fica o desafio dos Verdes / José Luís Ferreira
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